Há uma mulher aqui, entre os escombros
Há uma mulher aqui, entre os escombros
Há um corpo, há consciência - quase sempre
Há mais sede que fome, mas muita sede
Sob a viga destacada e caída
Há uma mulher
Ela não geme, ela não grita, ela não reclama
Ela não, ela nem,
É verdade que dói e inflama
Mas ela sequer sangra
Há uma mulher
Debaixo dos sonhos e das angústias dos salvadores
Dos bravos, dos nobres
Dos não violentos e perfeitamente médios, por isso,
Esplêndidos como a lua
Acostumados a se iluminarem de luzes outras
E com os dia que passam incólumes e ridículos
Há homens
Eles abrem mapas, cachorros farejam
Localizadores localizam
Veios vogam corporativismos
E afetos, únicos, só deles
Amáveis entre si, comemoram seus esforços
Brindam, sentados sobre a viga-mãe
Se felicitam
Homens
O grande acidente de todos
Mesmo que em massa, percebam, é uma oportunidade
Construir algo novo, sabe?
Acima, piso sobre piso
Assim caminha a humanidade
Mas--
Sim, há uma mulher sob os destroços
O vozerio dos homens sopra como uma estática distante
Uma textura, um rabicho de trilha, um burburinho
De fala, mas que ela não precisa atender
Não ela
A carne empacotada, o sangue coagulado, a língua entre dentes
Os pensamentos tão seus
Egéria natural
Suco de seiva
Tigela sem leite
A natureza a ceder, as vontades em chamas
Magma de uma casa que caiu para
Há uma mulher
A criar raízes e nutrir-se de si
Florescer das ruínas
Tanta pedra, poeira, que a natureza tomou rapidamente para si
Imóvel e pulsante, ela acontece
Enquanto a dor formiga até anestesiar
Sim, há uma mulher
Verte-se na terra
Em seu último suspiro de sensação em seu corpo
A areola do que cedeu em sua boca como uma paçoca crocante
Lábios, dentes, dedos
E mais pernas do que nunca
Ela repousa a cabeça em descanso
Quer cantar uma música
Não há tempo a perder
Sim, há uma mulher aqui entre os escombros
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