Tenho pensado muito sobre coisas que fazemos com as mãos

Tenho pensado muito sobre coisas que fazemos
com as mãos

sobre as minhas mãos, de pele morta ruída

na pontinha

alguns cortes acidentes

securas

asperezas

e umidades de relento

que trago

e trago em minhas mãos

 

às vezes, de canto

quietinha, em alguma ponta dos dias

reverifico essas mãos

mostro-as para a luz da janela

e eu busco, eu anseio

por iridescências refletidas

de fora

de caminhos da mão

de explicações para o mal-estar

geral!

da dor da lombar

onde levo minha

mão e minhas cantigas de respirar

 

elas pactuam, porque assim também fazem as mãos

as minhas, não são tão diferentes

talvez mais curtas e anafadas

mas elas são

mãos

e se abrem e enrijecem e 

batem na mesa

no braço sugado

na água

no sexo

batem batem batem

podem mesmo, essas mãos, amaciarem minha própria carne?

 

 

Não. 

mãos, quero tentar algo diferente

 

não firmar a hipocrisia ou o sudário

não retirar, pelo apertar das mãos

eu quero 

mãos de colocar

de xuxar

de alisar

de morder

de rabiscar

de balancear

e de gritar uma música de batucar com mãos

de liberdade

sobre a porra da banda fúnebre que não para de passar

na minha rua 

 

contamos dedos, feridas, causos, imaginários, dores alheias

contamos

um, dois, três, cinco, dezessete vezes, dedos, unhas

dores alheias

e levamos as mãos ao ventre que temos

e contam por nós as areias da ampulheta até, até, até

mais mãos serem parte do enredo de tais braços

em riste

sem punho

com eco

com lei

sem léu

 

são tempos de reis e mãos decapitadas

também pés, cortados, tortos, sim, mas temos rodas

e temos mulheres com 

mãos e ventres

e lágrimas

 

muito hidratante, mãos

pouca clemência

mão, no pé

mão, na boca

mão, no pau

no pau, no pau

no teu, e teu, e teu

e tuas

mãos, sobre a minha insconsciência

mãos que levam à deriva de mim

 

mas as mãos são um todo daquilo que me torno

e tenho tanto, acontecido,

escorrido para fora 

a construir, semear,

e, às vezes, a lembrar, porque lembro, e sei

sabia? eu sei, eu sinto aqueles dias

eu olho

as minhas mãos

e estendo sobre meu peito

e eu adormeço

quente

de lágrimas

 

pouco hidratante, que esqueço

menos clemência

ainda


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