Outros verões



Gostava de pensar sobre a náusea,
enquanto rodava, rodava, rodava.
Pelas esquinas da sua vizinhança, com cheiro
De flor, roxa,
insuportável.

 

Você ria, risos de anzóis

Pequenos, brilhantes, beliscantes

no meu estômago, também

O refluxo

As chamas abdominais...

Adoráveis regalos!

 

Um veneno mortal, microscópicas doses

Um combinado nosso,

Um mesmo caminho a pés descalços

Sobre o asfalto quente

 

Mas me afagava, 

E me ainda afago,

Sobre isso,

Nós e o pior dos verões.

 

Me nutre

De torpor, 

Bobo, risonho, teu, mas 

outro.

 

Circulava, pulava 

As linhas,

As suas, as minhas,

Como se fizesse o caminho de casa,

Sem casa.

 

Eu volto e refaço os votos

Com o inferno

Pra ter algo de dejavù

No meu suor escorrendo pelas costas.


O pavor da luz,

A umidade desconcertante do ar,

E das minhas 

Fendas.


A chave fora

Numa tarde invulgar

Deitada ao mar.

Foi saber daquilo que compõe,

Canções elementais

E sereias.


Não vim até aqui por melodias.

Tenho andado tão

surda


Contudo, penso no frescor dessas águas

Batendo,

Chocando,

Insistentes e frias

Sobre bochechas, lábios, cabelos, ouvidos, nuca.

Na beleza azul, profunda,

Da asfixia


Outros verões


Não há o azul, sabe?

Só há vermelho

E chumbo

Em volta.

 

Me dá angústia pensar em espirrar na rua

Um ar paira sobre calçadas

É denso, e quente, e úmido, difícil de respirar

É quente!

 

Me protejo nas sombras,

Nos alpendres, dois deles

que numeramos e batizamos

naquele verão

queimando

assustador

sob a chuva.

 

A luz dura

É um soco na minha sanidade

O suor, a tontura, 

A náusea, lembra?

Assim são os verões.

 

Mas sairei

Distraída

Com sua camisa verde

Como se não estivesse

Aqui, gasta,

partida.

 

Voltas do mesmo caminho. Para o não.

O vazio. 

O chumbo na boca, nas cores, mas inaudível

O grito.

 

É verdade, a água abafa os ruídos.


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