Lavanda dos dias

Cansaço, calor, luz
Que escorre inócua
Da soleira, de viés
Ao vermelho
Que retornarei

Sem pai, mãe, pátria
Sem deus, sem Deus!
Desço as escadas
Ajoelhada sobre as crenças de outrem
[Outra vez]
Dobrando lençois e fronhas
Pelas mansardas, entre paredes e
Janelas.

O sangue, sim, o sangue
Irmãos que não se sabem
À guerra de todo
Dia, retornaremos!
Primeiro, pelo café da manhã,
Ao fim, pelos restos requentados 
para a janta.

Nos arrastamos pelo espaço
O sangue na garganta
Sim, eu disse sangue
De novo.
Aqui, na ponta dos dedos
[Vê a lua lateral, que linda!]
Já não há tempo para mãos entrelaçadas

Eu que talvez me projete, lance,
Santa feita tela sem textura
Madalena feita busto em carrara
Mãos, dedos, corpos só cabeça
Pergunto: retornaremos?

Eu vou, arco sem flexa
Grito à caça, sem caça
Corpo içado à frente da caminhada
Norte, sem sapatos
Eu insisto. Nós retornaremos
À sapateira de papelão, à desordem.

A morte e a vida dançam
Com meus filhos, e com os nossos
Corro com as lobas [será, corro?]
Com doçura
desespero
garras.

Terra infértil,
feita fértil
No vaso esquecido do canto.
Com água de borra de café,
Dando vida às cortinas emboladas.
Também, à Poeira.

O cotidiano é uma porrada, já sabíamos.
Mas, retornaremos, de novo.
E ao passo que se traz,
que se leva,
Eu vou, Godiva no ar, eu
Voo

Doo, sentencio e dedico, dentro e fora,
O vermelho.
Esse, que você
Sempre
Detona
Sobre a roupa de cama dobrada 
à lavanda.

Ouvi aquele dizer:
No presente, só sabemos quando não nos sentimos
felizes.
Depois, a falta da felicidade ida
no cheiro da lavanda 
na dobra, no sabor
na dança, na meia trocada
que já foi
nos dias.

Eu lembro, e retorno,
antes, e sempre tanto.
É que os cheiros de que gosto
me preenchem 
do amor, do canto  
e da náusea.


Comentários

Postagens mais visitadas